teatro anatómico
Bom dia. Entra e fecha a porta. Vem verificar as nódoas visíveis sobre a pele. Finge-te erudito no asseio, e que zelas pelo corpo como bibliotecário em Alexandria. Não receies, que fogo nenhum poderá destruir o legado que herdaste e vens curar com precisão de luva. Aguenta-te no acidente, que os objectos frágeis são susceptíveis à perda eterna, ao cabo da extinção, ao fino fio tenso entre os picos, a tremelicar sobre o abismo da existência. Se sentires que o meu corpo vacila dá-lhe quarentena e deixa-o em repouso como se fosses jejuar no deserto. Ao regressares move-te com atitude felina ou cautela de pluma. Abre muito devagar cada poro e liberta o mofo, sopra para que se respire, observando se as sombras se espantam. Leva o meu corpo como troféu derradeiro para o teatro anatómico e faz suspender a luz. Sai e fecha a porta. Boa noite.
_
foto de Sven Rok
Comentários
Enviar um comentário