o trigo nas tuas mãos



Deixa-te inebriar pelo calor do toque das minhas mãos que em limpa manhã desejam procurar-te, perde as estribeiras do bom senso, cala a moralidade, contraria o estigma da boa conduta para que recebas o meu corpo em prado dourado pelo sol, trigo nas tuas mãos, o consolo de me teres a colocar a língua sobre os teus mamilos, comigo a afagar o sal da tua pele que vai explodindo de tremores, e te arrepiares na confusão dos dedos e os teus cabelos sobre os meus braços, pescoço, os ombros, tu a escaldar sob os sentidos que te avivo ateando fogo e chuva e depois mais fogo e sol, e toda a manhã numa sinfonia de toque com seda e sede e fome e apetite; as nossas bocas unas despertando e desmaiando na raiz das nossas línguas, um só músculo de desejo e frémito…

Oh meu amor, minha ninfa, minha gata de janeiro!... O que há em ti que toma posse do que sou e descontrola tudo o que o coração comanda e faz o meu corpo de tal condição refém? Eu hei-de em ti vir-me para que te venhas tu a resgatar o desejo em polpa de pêssego; deixa-me sentir o desmanchar da minha carne sobre a tua. O mundo vem, vem-te comigo e com o mundo, a sentir que é vida os corpos e duas almas numa comoção de tudo quanto quero e que me une a ti: vir-me na tua flor para deixarmos de ser apenas eu, apenas tu, e sermos plenitude de um nó de simbiose sempre eterno. Já não há existência sem ti, deixa que me venha e me renasça dentro do teu ventre, inebriante útero que há-de conseguir do vazio deixar-me limpo e, como com um vagido, recomeçar a viver.


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foto de Elsa Mota Gomes

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