macieira


Segue o carinho da minha mão com a tua, descendo e sem insinuação sobre o teu corpo com a brisa que percorre a manhã clara num prado de eternos sonhos. Gota a gota, o orvalho como contas do nosso humor. O teu ventre exala um hálito de gula, faz-se de forno de uma casa onde habita, em singela atitude, o nosso desejo. Fruto agridoce nascido nas madrugadas de abril, enquanto maduro maio ensaia o verão.

Nessa altura, então, ver-nos-ão nuas, correndo contra a falácia da família tradicional, com as papoilas crescidas indiferentes à giesta amarela, crendice contra o bicho-peçonha, tão antigo quão cinzento.

Dás ao ombro, com esse teu sorriso. E eu rindo. Os cravos vivos no nosso humilde jardim.

Mais adiante, sangue do nosso sangue porque dos nossos seios há-de beber, correrá também o nosso Adão infante, sinalizando a alegria da nossa pequena casa com gatos observando os pequenos bichos entre a horta, na qual ambas temos vindo suando para construir o futuro que queremos.

Um futuro com outra paz que não um simples ramo de oliveira no bico de uma pomba.

Estará, antes, na maçã do nosso Adão, futuro homem que erguerá um futuro que nunca nos esquecerá. O teu ombro poisado no meu, hoje, enquanto observamos a pequena macieira mui tímida ainda da sua esperança, plantada sobre a humidade que lhe demos para que suas raízes possam alicerçar-se neste sol que se espanta.

Recolhemos à sombra fresca com um beijo a concretizar promessas. Como te amo, como me amas. Não somos adorno. Não somos exemplo. Não somos epígrafe de qualquer coisa que seja. Somos apenas duas mulheres que querem estar juntas, com o desejo de construir a família que escolhemos.

Deixa lá o mundo.

Nenhuma humanidade mereceu o mundo, nem o mundo mereceu a humanidade em que cremos. Segue, segue o carinho da minha mão com a tua. Sem insinuações, porque sabemos ao que vamos, ao que queremos. O teu corpo no meu, transpirando ambos para a seiva da macieira que há-de crescer, e vingar.


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foto de Alexey

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