gaveta íntima
Não me destruas
o ego com essas cuecas de trazer por casa. Sem elástico, rotas na curva incompreensível
da cintura. É dizeres: aqui já não importa. É eu saber: limpei mal o pó das janelas,
por onde ainda se ouve o melro assobiando. Esse pó condiciona a audição de tão
clara melodia. A miséria das tuas cuecas intimida a canção que tenho. Uma que
tenho. Uma para ti. A canção não é um festival de verão. É o peixe do almoço, o
lento e silencioso vagar dos dentes antes da tarde, entre castanha assada. Vê
devagarinho para entenderes melhor: naquelas casas, acolá, lá mais em baixo: as
suas chaminés, vês? Surgem delas os pedaços de sobreiro em combustão, e aquele
fumo – logo virá o aroma – diz-te que é tempo de arrumares a gaveta da tua
intimidade. E de dares ares novos ao meu ego quando te procura, ufano por
convencido estar que muito me queres seduzir. E que por isso te quer pronta. Prometo
churrasco de frango, logo que haja uma ressa de sol neste inverno da (minha,
tua – nossa?) vida.
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