por acabar


Dormito sobre os livros com a baba rente ao queixo enquanto o gume do vento vai caçando os braços desprevenidos lá fora com este sol a brindar a tarde embora o frio outra vez, e sinto que tenho mais sede mais fome mais desejo e não descanso como seria suposto, com os cães cansados de latir, a deformar-me a consistência dos sonhos, qualquer coisa entre a vigília e o sono, qualquer coisa entre a cor e o preto e o branco e o cinza, entre o cigarro e a cinza, e tacteio vagamente vazio as palavras pelos livros dentro e vou como um cego analfabeto entre o verde e o musgo, a nadar, a nadar – um cego que não sabe ler em braile, enquanto o vento lá fora caçoando dos braços desprevenidos, eu de baba rente ao queixo, mexes-me um braço, afagas-me o peito do ronco alarve e dos livros, os que leio, os que sei que leio, juntos à face rubra numa quietude muito atribulada para quem se quer quieto, os teus dedos a limpar-me o queixo, e o queixume a varrer livros e palavras numa braçada de água, entre o musgo e o lodo, o queixume de mim a rogar-te, enfim

- Deixa-me dormir, deixa-me dormir.


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(foto de autor desconhecido)

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