âncora

foto de Victor Peryakin


Não encontrarás alguém

(nunca)

que se sinta completamente seguro, em terra firme, na costa ou além-mar, sem a presença de uma âncora. Isto é: o que te mantém firme, na água ou em terra, onde te der a certeza de estares a salvo. Simplesmente a salvo, para conseguires tomar o rumo que pretendes.

As certezas, porém, sabemos por senso comum, são como a verdade: falíveis, de desconfiar. Então, a âncora de que falo estará sempre entre a diagonal dúvida e uma inerente necessidade de a crermos como concreta noção de um chão, emerso ou imerso. Indigente ou diligente. Onde sentes que os pés podem discernir que caminho tomar, e seguires qualquer direcção que achares conveniente – pelo menos aquela em que mais acreditas.

Ora, por via dessa dúvida, só tenho a questionar:

- És tu a minha âncora? Aguentarás, em fundos limosos, as contraditórias correntes

(de água, de vento)

ensimesmadas, caprichosas, traiçoeiras? Acaso não te acometerá a inércia por erosão das cordas que te seguram e se vão desfazendo

(com a água, com o vento)

pela constante agressão do tempo que passa? Em suma, terás a corajosa resistência para me segurares nesse chão que pretendo firme, e nele acredito?

Em caso de resposta negativa ao enunciado, por favor consultar a gritante lista dos falhados, e das futilidades que

apenas

flutuam no mundo do de toda a gente, que rejeito ser o meu. Aí encontrarás tudo o que de ti não depende, onde podes ser só um horizonte onde se colocam as vistas e depois são viradas as costas, quando caída a abundante penumbra.

Comigo, nesse mundo

(nesse ou neste, quero dizer o mundo onde tudo se atravessa e atropela)

não. Aí jamais me encontrarás, quanto mais ancorar-me…

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