a promessa

foto de Alexander Litvishko

 

Que fazes no escuro? Deste conta que

- Natal, salto do pardal

e que, no caminho, já vamos podendo argumentar

- Janeiro, salto do cordeiro

num aceno de despedida a tudo o quanto houve de efémero, pardo, deprimente no mês de dezembro?

Como agosto, dezembro é um dos dois meses do ano mais preenchido de domingos seguidos uns atrás dos outros com aquela mole esperança que a próxima semana finde e venha outra; porém, repetindo-se o dia na manhã seguinte, e na seguinte, e na seguinte… sem semana nem sábado que nos traga alegria de cá estar, no mundo.

Até que olhas a abóbada do céu nocturno de janeiro novo e percebes a mudança. A cada minuto que a inclinação do planeta nos presenteia, vemos a claridade recuperando o fôlego. E tu, outra vez, a falar sobre os dias mais claros que, mesmo com chuva, neve e nevoeiro são sempre manhãs, e depois tardes, com essa renovada claridade, ainda que o frio prossiga

(há-de ser tudo a seu tempo).

Pouco faltará para que a seiva comece a dar lugar aos pequenos esboços de rebentos no alto das árvores, tão cansadas que ficam, ano após ano, da sua condição de esqueletos ao vento. E até mesmo este assobia nas montanhas um acorde diferente, encorajando a timidez do tojo. Os ribeiros dão essa força. Água que descerá, do céu ou das nascentes, trazendo boa nova do ano novo após a noite mais longa assinalada pelo solstício de inverno. A terra abrindo.

Talvez nem seja o inverno essa personificação de um velho. Poderá ser um infante….  Melhor: uma infante, aquela que atinge a puberdade quando a primavera iniciada, tão pueril de gestos como de corpo virgem e, entretanto, tão bela e sedutora nas suas formas frescas. Ou, ainda, se quisermos, um casal de infantes, macho e fêmea, ambos vigorosos, belos e sedutores, que desabrocham primaveris e fecundam o ar estival que tanto ansiamos.

Sai do escuro. Vai atrás do sol, dos crepúsculos matinais e vespertinos. Observa como se transformam dia para dia, crescendo, caminhando para a meta estival, para a mágica luz mais longa dos dias. Será vez do nardo nos jardins, dos frutos vermelhos, da sede saciada em ribeiro fresco.

Dá-te a oportunidade de poderes seres outra vez. Não chores, se não for de alegria. Ainda que já o outono te condicione o corpo, deixa que haja verão, cada ano, mês de junho aberto numa promessa para te sentires, sempre e todas as vezes, que és e serás sempre o menino ou a menina dentro de ti. Morto ou morta jamais. Como do efémero de dezembro nos cresce essa sede de vida!

Prometes que te redimes, como se ainda agora nascesses? Não te escondas então nesse escuro que já não será. Nunca será. Terá o seu fim. Ciclicamente. Como tu, como todos nós. Daremos sempre nova vida. Razão para que o planeta gire e se incline. Do outro lado também estás lá, a perceber o quanto isto se renova.

Entende: é assim a vida. Nada de esmorecer, então.

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