fado
(tão virgem ainda e, talvez por tal
condição, tão molhada, já que novembro um amante sedutor por envolto de misteriosos
nevoeiros quando o sol, desistindo e decidido em consequentes lamúrias de
timidez)
obrigando as casas, dos apartamentos
em prédios de vários e crescentes andares, a acenderem, quais cicerones, as
luzes das suas pequenas salas, quartos, cozinhas, concentrando essa condição de
aconchego para quem, da rua, e desprevenido da chuva, se aligeira de ternura
para chegar ao conforto do seu lar
e eu
(perdão, não eu, mas outros por mim,
embora seja eu quem escreve e lhes dá voz)
perdido da noção desse tempo
decorrido, esquecido que a hora antecipada no crepúsculo que esta precipitação
não se deu de se lhe perceber, estendo o grito para que não haja fim, e que o
princípio tão precipitado da noite não dê razões para a solidão se plantar, a
escutar e vigiar o comportamento dos que não se prestam a
«Que
destino, ou maldição
manda
em nós, meu coração?
Um
do outro assim perdidos
somos
dois gritos calados
dois
fados desencontrados
dois
amantes desunidos.
Por
ti sofro e vou morrendo
não
te encontro, nem te entendo
amo
e odeio sem razão!
Coração...
quando te cansas
das
nossas mortas esperanças;
quando
paras, coração?
Nesta
luta, esta agonia
canto
e choro de alegria
sou
feliz e desgraçada!
Que
sina a tua, meu peito,
que
nunca estás satisfeito;
que
dás tudo e não tens nada.
A
gelada solidão
que
tu me dás, coração
não
é vida nem é morte.
É
lucidez, desatino
de
ler no próprio destino
sem
poder mudar-lhe a sorte.»
nesta voz que
é sempre nossa, de nós impressa em palavras, murmúrio e canção. E destino. Desatinos
do amor, que nos confina na totalidade. Nada menos, nada mais que isto. Chova.
Vão sempre surgir outros amanhãs, sem a constância da chuva a insistir nesta
conforme solidão.
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