do sal, poema intermédio a marília
Ibai Acevedo via Isola Mentale² |
Sabes, Marília? O meu verdadeiro amor nasceu
(faz mais anos que tu)
a sul de uma serra de fraco declive, entre a terra vermelha que apaixona o trigo e a areia quente a receber o estival mar em correntes mediterrâneas lembrando epopeias da Grécia antiga. Esse amor fui eu encontrar há uma trintena de meses, mal sabendo adivinhar o que havia de seguir-se depois. Fiz-me de tonto todo este tempo, e concretizei na minha mente que todas
(mas todas)
as mulheres haviam de ser apenas uma, trançadas em corpos e almas difusas e díspares, como esses nevoeiros que assombram os cais que testemunhas a norte. Engano meu: o amor imaculado não se difunde, materializa ou divide, e todas as minha acções e palavras foram tão só a saudade do que não sabia dizer.
Entende isto, Marília: a luz do sul não tolera sombras, é feita da mesma claridade do éden e embala-me sereno sem necessidade de beijos ou abraços fogosos, nem das quentes refegas dos nocturnos e ineficazes labores do amor granítico, ciumento e possuidor, exaurido de frio. Faz-te compreensiva, que nem eu imaginaria tal enlace, a deixar-me ir numa corrente de palavras moldadas a ouro e encrustadas a diamante – sem chamar quaisquer lugares-comuns, mas eis a inteira verdade.
A derrota de alguém não é sempre a vitória de outrem, e desta forma ninguém perde o chão nem há-de outro receber o céu de mão beijada. Inaugura-te como eu me rendi, sem tramas nem patranhas. O amor esquece os equívocos, aliás… nesta exultação de tudo, posso crer que os equívocos serão as estrelas mais distantes em tremeliques eternos de longa vida
(mais que a humana)
ditada pela mente criadora por milénios até à exemplar extinção dos corpos celestes
(extinguir-se-á o amor?).
Logro a felicidade sem permeios, apenas enleado no que os escribas antigos profetizaram, pouco sabendo dos astros e da infinitude dos universos, mas conscientes das marés:
(agora, neste parágrafo, tudo o que ficaria por dizer, já foi dito antes, anos antes de os teus pais imaginarem sequer conceber-te. Solta o sonho, faz por completar o poema por intermédio. Quiçá uma epopeia não terás em mãos)
– o sal como a celebração do amor, que não há-de morrer na praia.
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