vida má rês




A vida é um fado de gume bem afiado: fatia-nos em porções desiguais consoante a ingenuidade, a altivez, a cumplicidade, a cupidez, a sinceridade, a desfaçatez, a genialidade e a estupidez que carregamos durante os anos. E por último, a ansiedade de que a senilidade venha trazer-nos a sensatez de caminharmos

(seccionados em fatias-fiambre de vive-um-dia-de-cada-vez)

com a resignada consciência da nossa finitude.

E eu desfaço rude todo o espaço em volta na revolta por esse estado induzido de embriaguez, julgando que tudo posso e mando enquanto o mundo tão insano se dissolve nas teias dos seus porquês.

A vida é um desdém, em afiado gume: fatiados, cozinha-nos depois muito bem, de goela à gula, em brando lume.

É traiçoeira e de má rês, a servir-nos de alimento a um surdo-mudo deus, energúmeno que nunca soube se afinal nos queria, ou se desejaria aniquilar-nos de vez.

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